
A decisão dos Estados Unidos de remover a tarifa adicional de 40% sobre o café brasileiro encerra um período de forte incerteza e marca um novo ciclo para toda a cadeia produtiva nacional. A medida, oficializada com a modificação da Ordem Executiva 14.323, reverte o tarifaço aplicado originalmente pelo governo norte-americano em 2025, que havia alterado de forma profunda a competitividade do produto brasileiro no mercado internacional. Conforme registrado pelo Cecafé, a reversão representa uma vitória histórica construída ao longo de meses de negociações entre autoridades brasileiras, o setor exportador e suas contrapartes nos EUA.
Impactos econômicos e risco de perda de mercado
Durante a vigência das tarifas, os exportadores brasileiros enfrentaram um cenário crítico. O acréscimo de 40% sobre o café verde reduziu drasticamente a competitividade em relação a concorrentes como Vietnã, Indonésia, Colômbia e Costa Rica. O Cecafé apontou que, com a perda de competitividade, os estoques de café do Brasil nos EUA chegaram a zero, e torrefadores norte-americanos passaram a comercializar blends sem a tradicional participação do café brasileiro, o que poderia consolidar a substituição por outras origens de forma duradoura.
Além disso, as exportações para o mercado norte-americano — avaliadas entre US$ 2 bilhões e US$ 2,5 bilhões anuais — haviam recuado quase 50% nos três meses anteriores à decisão. Caso as tarifas fossem mantidas, o setor projetava prejuízos adicionais que poderiam alcançar US$ 1 bilhão em 12 meses, acumulando perdas da ordem de US$ 3 bilhões na balança comercial do café. Esses números ilustravam não apenas o impacto econômico imediato, mas o risco de desestruturação de um mercado construído ao longo de décadas de relações comerciais estáveis.
Caminho até a reversão: diplomacia e articulação técnica
A reversão das tarifas é resultado direto de uma mobilização complexa envolvendo diversos atores institucionais. Desde o anúncio inicial do tarifaço, em julho de 2025, o Cecafé intensificou sua atuação tanto no Brasil quanto no exterior, apresentando estudos, análises técnicas e avaliações de impacto às autoridades de ambos os países. O setor participou de reuniões estratégicas com o vice-presidente Geraldo Alckmin, com órgãos federais responsáveis pelas negociações e com representantes da indústria norte-americana de torrefação. Ao mesmo tempo, manteve diálogo constante com a National Coffee Association (NCA), que desempenhou papel central ao defender a importância do café brasileiro para o mercado dos EUA.
As tratativas avançaram por diversas frentes: reuniões na Embaixada Americana, audiências com o United States Trade Representative (USTR) no âmbito da investigação da Seção 301 da lei comercial dos EUA, participação em missões empresariais organizadas pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) em Washington e suporte técnico durante encontros presidenciais na Ásia. A argumentação brasileira destacou fatores como sustentabilidade, rastreabilidade, qualidade e relevância econômica do café brasileiro para consumidores americanos — pontos sistematicamente incorporados na defesa do setor ao longo do processo negocial.
Novo cenário: retomada dos blends e reconstrução de relações comerciais
Com a eliminação das tarifas, o setor exportador recupera as condições de competir em igualdade de oportunidades com outras origens produtoras. Líderes do Cecafé reforçaram que o foco agora se desloca para a retomada do espaço perdido nos blends das principais marcas dos Estados Unidos, esforço que envolve reconstruir relações comerciais, restabelecer contratos e demonstrar que o Brasil continua sendo parceiro confiável e tecnicamente qualificado para atender às exigências do mercado norte-americano.
Segundo representantes do setor, a reversão garante previsibilidade e evita que os impactos negativos se tornem irreparáveis, especialmente em um momento em que o café brasileiro tem sido amplamente reconhecido por sua sustentabilidade, baixa pegada de carbono e investimentos contínuos em produtividade e inovação. Esses atributos foram destacados durante a COP realizada em Belém e reforçam a competitividade do Brasil no cenário global de transição sustentável da agricultura.
Ponto ainda pendente: a situação do café solúvel
Apesar do avanço significativo, a isenção tarifária não contemplou o café solúvel. O Cecafé e a Associação Brasileira das Indústrias de Café Solúvel (Abics) seguirão trabalhando nas negociações, considerando que o solúvel representa cerca de 10% dos embarques para os EUA e possui alto valor agregado — cada emprego gerado no processamento de café verde pode resultar em até quatro postos de trabalho na indústria de solúvel. A defesa pela inclusão desse produto nas futuras isenções tem sido prioridade, dada sua relevância econômica e sua importância na estratégia de expansão dos derivados brasileiros no mercado global.
O que significa para os produtores rurais
Para produtores e cooperativas, especialmente aqueles focados em cafés de qualidade e produção sustentável, a decisão norte-americana oferece oportunidades concretas. A recuperação do mercado dos EUA tende a favorecer nichos de maior valor agregado, estimular contratos de longo prazo e reaquecer a demanda por cafés especiais. Ao mesmo tempo, o setor reforça que a reconstrução do espaço no mercado exigirá continuidade: presença institucional, diplomacia comercial ativa e investimentos contínuos em rastreabilidade, sustentabilidade e qualidade sensorial.
Oportunidades e Desafios no Novo Cenário Comercial
A retirada das tarifas marca o encerramento de um dos episódios comerciais mais críticos para o café brasileiro nos últimos anos. A vitória resulta da articulação entre governo, setor produtivo e aliados estratégicos nos EUA. Ao restabelecer a isonomia comercial, abre-se um período de recuperação e reorganização das relações de mercado, com a urgência de trabalhar pela isenção do café solúvel e de consolidar novamente o Brasil como protagonista no principal mercado consumidor global. Para o produtor rural, o momento exige atenção, planejamento e capacidade de aproveitar as oportunidades que emergem desse novo cenário.
Fontes:
CNN Brasil. Cecafé: impacto do tarifaço seria tragédia ambiental, social e econômica. CNN Brasil, 20 nov. 2025. Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/economia/cecafe-impacto-do-tarifaco-seria-tragedia-ambiental-social-e-economica/
MENDES, C. Após retirada das tarifas, Cecafé trabalha para retomada dos blends e para isenção também do solúvel. Notícias Agrícolas, 21 nov. 2025. Disponível em: https://www.noticiasagricolas.com.br/noticias/cafe/411279-apos-retirada-das-tarifas-cecafe-trabalha-para-retomada-dos-blends-e-para-isencao-tambem-do-soluvel.html

